Não sei se você sabe, mas trabalho em um escritório contábil desde os meus 13 anos.
Era uma pequenina empresa familiar e tínhamos nossa sede numa salinha pequena, em um bairro chamado Jardim Ubirajara, localizado na Zona Sul de São Paulo.
Nossa salinha ficava em um prédio que tinha um dentista e uma escola de datilografia. Sim! Datilografia! Os mais velhos saberão o que é isso, rsrs.
Enfim, nossa sala tinha 3 mesas. Trabalhávamos eu, minha mãe e uma prima.
Um dia, estávamos eu e minha prima trabalhando quando chega um rapaz alto, encorpado e pergunta:
“Vocês fazem recibo de compra e venda?”.
Claro que, como pessoa proativa que era (na verdade, interessada no dinheirinho que ia entrar), respondo prontamente com um sorriso nos lábios:
“sim”.
O rapaz, então, coloca um revólver no balcão e me diz: “estou vendendo essa arma e preciso de um recibo.”
Minha prima, sabiamente, se agachou e foi para debaixo da mesa. Eu senti aquele geladinho na coluna, os joelhos tremiam e o coração foi a mil. Vi minha pequena vida passando diante de meus olhos. Porém, não podia recuar, afinal, se ia morrer, ia morrer no cumprimento do meu dever.
Peguei um papel e anotei os dados necessários para a elaboração do recibo. Tremendo, me sentei, coloquei o papel na minha Remington, o nervosismo era tão grande que a folha não ia reta e os dedos tremiam – acho que foi o mais longo trabalho de datilografia de minha vida.
Finalmente, eu termino, caminho lentamente e entrego a ele o recibo. Ele confere, olha para mim e pergunta:
“quanto é?”.
Eu, com minha voz trêmula e querendo agradar, pensando que, talvez assim, minha vida fosse poupada, respondo:
“nada não, senhor”.
Ele olha para mim fixamente por – em minha opinião, umas 15 horas de total o terror – uns 30 segundos e me responde:
“menina, todo trabalho deve ser pago” e me entrega, em dinheiro de hoje, uns R$ 50,00. Pegou o seu recibo e foi embora.
Alguns anos mais tarde, ao estudar contabilidade do terceiro setor, aprendo que até o trabalho voluntário tem seu custo – mesmo que não seja pago. Ele é contabilizado pelo valor de mercado daquele trabalho e tem sua contrapartida como uma receita de voluntariado. Interessante não?
Sábio esse conselho você não acha?